terça-feira, 1 de junho de 2010

Se ao menos soubesse cantar-te

É assim que eu me lembro.
Não quer dizer, necessariamente, que a minha memória seja exacta e fiel em todos os pormenores. Não posso garanti-lo, nem jurar que assim seja.
Na verdade, é bem mais certo que o enevoado e emaranhado de pensamentos se tivessem tornado na manta felpuda e quente onde, confortavelmente, aconchego as minhas imprecisas recordações.
O tempo e a idade não ajudam, decerto, à fiabilidade das memórias.
Não é que esteja especialmente preocupado ou aborrecido por ser assim.
São essas as minhas lembranças, e que se lixe quem vier dizer que foi diferente.
Se há coisas a que posso chamar minhas, são essas. As memórias. Mesmo quando quem dança nelas esteja agora virada para outros palcos e outras músicas.
Poderia servir-me de consolo, de paliativo, o facto de saber que, talvez, os bons momentos não tenham sido tão bons como recordo, e os maus, tão maus como senti. Mas, com a relatividade da nossa condição humana, e da nossa razão, também posso, igualmente, pensar que a moderação do tempo faz crer que foi apenas bom aquilo que foi extraordinário... e, assim, o efeito é o contrário.
De qualquer forma, a ternura com que te penso continua a dar-me a certeza absoluta de ti.
Passamos a vida fechar portas, algumas com correntes e cadeados de ferro fundido em desencanto e forjado em lágrimas por um qualquer serralheiro maquiavélico, mas tentamos deixar sempre aberta aquela por onde fugimos e nos perdemos, onde nos espojamos e ronronamos de felicidade adiada.
Hoje, resta-me o sol para aquecer a minha pele quando, no que me lembro, era a tua que me aquecia.

Se ao menos soubesse cantar-te e trazer-te de volta em mim, livre, na melodia…

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